Os pequenos atalhos das mulheres. E o preço disso na carreira.
- ABRH-RJ

- 11 de ago.
- 3 min de leitura
*Por Catia Porto
Não começa no trabalho.
Quase nunca começa no trabalho.
Começa em casa.
Nos pequenos silêncios.
Nos “deixa pra lá”, “tanto faz”, “pode escolher você”.
Nos “não é nada, tá tudo certo”.
Começa quando, aos poucos, ela vai abrindo mão de si mesma.
Para manter a harmonia.
Para não desagradar.
Para caber em um espaço que já vinha pronto.
Ela aprende, muitas vezes sem perceber, que é mais fácil ceder do que sustentar uma vontade. Que é mais seguro se calar do que bancar uma escolha.
Que é mais prático dizer “sim” do que sustentar um “não”.
E o corpo aprende junto.
A linguagem muda.
O tom de voz baixa.
O olhar pede permissão.
O corpo inteiro pede desculpas por ocupar espaço.
O que parece apenas uma questão de “jeito” ou de “educação”, é, na verdade, um mecanismo aprendido de sobrevivência.
E isso, que começa na vida pessoal, atravessa a porta do trabalho.
Vai da casa para a sala de reunião.
Do relacionamento para o comitê de liderança. Do “deixa pra lá” para o “não vou me expor”. Da renúncia silenciosa para o não reconhecimento.
Chega sutilmente:
→ Na dificuldade de pedir um aumento.
→ Na hesitação antes de levantar a mão.
→ Na sensação de impostora diante de uma promoção.
→ No medo de parecer “difícil” ao discordar.
→ Na angústia de ser percebida como “intensa demais”, “emocional demais”, “ambiciosa demais”.
Sem perceber, os pequenos atalhos que ela aprendeu a tomar para manter a paz… cobram um preço alto na sua carreira. Porque quem não aprende a dizer o que quer… dificilmente conquista o que merece.
Quem não se acostuma a ocupar espaço… acaba sendo empurrada para as bordas.
Quem vive para agradar… quase nunca é lembrada como liderança.
Isso não é um problema individual.
Não é sobre uma mulher específica.
Não é sobre falta de ambição, força ou competência.
É estrutural.
É cultural.
É coletivo.
Mas se torna pessoal quando a gente entende o impacto e escolhe quebrar o ciclo. Quando paramos de romantizar a renúncia e começamos a reconstruir a própria voz. Quando entendemos que nomear o que sentimos, o que pensamos e o que queremos… não é egoísmo. É existência.
Por isso, deixo aqui o convite à reflexão:
→ Quantas vezes você se cala para não incomodar?
→ Quantas vezes você recua para manter a paz?
→ Quantas vezes você aceita menos do que merece, só para não desagradar?
E o mais importante: qual tem sido o custo disso para você?
Dizer o que pensa.
Nomear o que sente.
Sustentar o que quer.
Não é sobre confronto.
É sobre pertencimento.
É sobre presença.
É sobre existir, inteira e onde quer que seja.
E lembrar todos os dias:
Concessão sem consciência é autossabotagem disfarçada de gentileza.
*Cátia Porto é Vice-Presidente Executiva de Pessoas da Vale. A Sra. Porto tem sólida experiência em empresas de diferentes setores e já liderou com sucesso a implementação, restruturação e transformação de áreas de Recursos Humanos no Brasil e no exterior. Como executiva, Catia tem uma visão de vanguarda, conduzindo seu trabalho com análises avançadas, inovação e muito foco no negócio. Ela estudou nos EUA na Universidade Dakota Wesleyan, é formada em Psicologia pela PUC-RJ, tem pós-graduação em Gestão de Recursos Humanos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diversos cursos em business schools como London Business School, Wharton e IMD. Durante sua trajetória, além do Brasil, morou nos Estados Unidos, Japão, México, Finlândia e Reino Unido. Ela também liderou projetos na China e na Índia. Catia passou por grandes empresas como Grupo Big, Walmart, Nokia, Grupo BAT e United Health Group (UHG).



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