Integração entre RH e Ergonomia: O caminho para ambientes de trabalho mais saudáveis.
- ABRH-RJ
- há 11 horas
- 5 min de leitura
A relação entre ergonomia e gestão de pessoas é amplamente reconhecida pelos profissionais da área de ergonomia, mas muitas empresas ainda não incorporaram práticas ergonômicas como parte estratégica da gestão de recursos humanos. Entendemos que ambas as áreas visam melhorar o bem-estar dos colaboradores, aumentar a produtividade e promover a sustentabilidade organizacional. No entanto, a integração efetiva dessas práticas na gestão ainda é um desafio para muitas organizações.
As recentes atualizações na NR-1, implementadas em agosto de 2024 pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), trouxeram mudanças significativas no capítulo 1.5, que trata do gerenciamento de riscos ocupacionais (GRO). As reformas aplicadas a norma, destacam a importância dos riscos psicossociais, e a partir disso, criam uma oportunidade para a integração mais estruturada entre ergonomia e gestão de pessoas, de forma a provocar a adoção de medidas mais eficazes para a prevenção de riscos psicossociais e a melhoria das condições de trabalho.
Tais mudanças trouxeram diversas implicações para diferentes áreas das empresas, que inicialmente precisariam atender às exigências da Norma até o dia 26 de maio deste ano. No entanto, a Portaria nº 765, de 15 de maio de 2025, prorrogou em um ano o prazo para a entrada em vigor da nova redação do capítulo 1.5. Essa prorrogação oferece às empresas um período adicional para adaptação e estabilização frente às novas diretrizes, permitindo que os setores de Recursos Humanos aprofundem seus conhecimentos sobre o tema e estruturem, com mais propriedade, ações eficazes de gerenciamento dos riscos psicossociais.
O Guia de Informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho, desenvolvido pelo MTE – Ministério de Trabalho e Emprego (disponível em https://www.sstgames.com/material-gratuito) ilustra as razões de tais alterações, tomando como base relatórios da OIT e da OMS de 2022 que apontaram uma perda de aproximadamente um trilhão de dólares para a economia global, associados a questões relacionadas a saúde mental.
No Brasil, transtornos mentais e de comportamento figuram desde 2022 em segundo lugar entre os motivos de adoecimento ocupacional. Para identificar contextos relacionados a saúde mental e comportamento, todas as classificações associadas a F41, F43 e F32 estão incluídos nesta estatística.
No contexto organizacional, os profissionais de recursos humanos são responsáveis, entre outras coisas, por realizar a descrição de cargos, que inclui estabelecer funções, competências técnicas, comportamentais e requisitos de capacitação, assim como identificar e desenvolver habilidades referente as funções. Já a descrição das atividades alinhadas com a área técnica, estabelecem normas, equipamentos, procedimentos e processos que envolvem a tarefa. A cargo dos ergonomistas fica a descrição do trabalho como ele é realizado, a demonstração das nuances de campo “in loco”, a descrição de como o trabalho é realizado, incluindo condições, materiais e equipamentos, assim como trazer soluções que não impactem nas saúdes fisica, mental ou social do funcionário e ao mesmo tempo agreguem valor a organização.
Muito se tem discutido sobre os riscos psicossociais e seus impactos tanto para os indivíduos quanto para as organizações. Mas afinal, onde esses riscos realmente se encontram? Eles estão presentes justamente na variabilidade do trabalho — naquilo que, em geral, não está descrito nos cargos formais, mas que emerge na prática cotidiana.
Na ergonomia, chamamos isso de “trabalho real”, ou seja, o que de fato acontece no dia a dia. Compreender essas variáveis é essencial para identificar potenciais riscos psicossociais e desenvolver estratégias eficazes para mitigá-los. Nesse contexto, o setor de Recursos Humanos tem um papel estratégico, pois detém conhecimentos e ferramentas voltadas à gestão de pessoas, o que o torna fundamental na promoção de ambientes de trabalho mais saudáveis e seguros.
A convergência que propomos neste artigo entre a ergonomia e o setor de Recursos Humanos possibilita uma abordagem mais ampla e integrada para a análise e gestão dos riscos psicossociais. Essa integração permite uma avaliação mais precisa das condições de trabalho, dos modelos de gestão, da organização das atividades, das interações entre colaboradores, líderes e equipes, além das competências individuais. Todos esses fatores exercem influência direta sobre indicadores cruciais, como afastamentos por adoecimento, ações judiciais e acidentes de trabalho.
A nova abordagem proposta pela NR-1 enfatiza a necessidade de um gerenciamento contínuo e sistemático dos riscos psicossociais, priorizando não apenas a identificação, mas também ou até mais significativamente a gestão eficiente de tais riscos, que em geral pode ser resolvido por meio da área de treinamento e desenvolvimento. A avaliação destes riscos passa a partir destas alterações, a ser um processo estruturado, permitindo determinar os níveis de exposição dos trabalhadores a situações que afetam cognitiva e psicologicamente o trabalhador, de forma a estabelecer medidas preventivas adequadas. Nesse contexto, o alinhamento das ações de RH com a Ergonomia se torna essencial para fortalecer a saúde mental dos trabalhadores, melhorar o bem-estar organizacional e impulsionar a produtividade. Evitando afastamentos e subsidiando possíveis processos judiciais.
A implementação eficaz dessa integração exige a participação ativa dos profissionais de RH, que desempenham um papel fundamental na adaptação dos processos organizacionais à nova realidade regulatória. A experiência de países como Austrália, Nova Zelândia e Reino Unido demonstra que legislações claras e práticas estruturadas podem contribuir significativamente para a eliminação de riscos à saúde e segurança psicológica dos trabalhadores. Além disso, a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho (EU-OSHA) desenvolveu modelos para estimar os custos do estresse crônico e dos riscos psicossociais, evidenciando o impacto dessas questões não apenas nas empresas, mas também nos trabalhadores e na sociedade como um todo.
A ergonomia, enquanto ciência, busca melhorar a interação entre os seres humanos e os elementos do sistema de trabalho, adaptando condições, ferramentas, equipamentos e ambientes para otimizar o desempenho e o bem-estar dos trabalhadores. Por sua vez, a gestão de pessoas, é um conjunto de práticas e estratégias voltadas para atrair, desenvolver, motivar e reter talentos, equilibrando os objetivos organizacionais com as necessidades individuais. Desta forma, a integração dessas áreas possibilita inovações e sustentabilidade, que beneficiam tanto os colaboradores quanto a empresa no que tange a gestão de riscos psicossociais.
Embora a ergonomia seja frequentemente associada apenas a lesões musculoesqueléticas e doenças físicas relacionadas ao trabalho, ela também abrange aspectos cognitivos e organizacionais. Isso inclui a adaptação do ambiente de trabalho ao corpo humano, a interação entre processos mentais e tarefas executadas e os fatores culturais que influenciam o bem-estar dos trabalhadores.
Cuidar da saúde mental do trabalhador é um desafio histórico que as recentes modificações na NR-1 nos trouxeram e somente soluções integradas conseguirão resolver, pois trata-se de um sistema complexo o alinhamento na promoção da saúde e do bem-estar dos trabalhadores e a melhoria dos resultados organizacionais. Apesar dos desafios envolvidos na implementação dessas mudanças, a integração entre ergonomia e gestão de pessoas apresenta um caminho promissor para a construção de ambientes de trabalho mais saudáveis, produtivos e inovadores.
Esperamos que este artigo tenha contribuído para uma melhor compreensão sobre a importância da ergonomia no desempenho das funções profissionais e na melhoria das condições de trabalho em sua empresa. Considerando que ainda há um ano para que as organizações realizem as adequações exigidas, este é um momento oportuno para que o setor de Recursos Humanos invista no aprimoramento de seus conhecimentos em segurança do trabalho, a fim de propor ações mais eficazes e alinhadas às novas exigências normativas. Abaixo, propomos uma bibliografia caso você queira saber mais sobre o tema.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ANTUNES, Samuel; PEREIRA, Anabela (Coords.). Avaliar, intervir e prevenir os riscos psicossociais: práticas e recomendações. 1. ed. Lisboa: Ordem dos Psicólogos Portugueses, 2023. 235 p. ISBN 978-989-53170-8-0.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria MTE nº 1.419, de 27 de agosto de 2024. Atualiza a NR-1 sobre Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO). Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/assuntos/inspecao-do-trabalho/seguranca-e-saude-no-trabalho/sst-portarias/2024/portaria-mte-no-1-419-nr-01-gro-nova-redacao.pdf. Acesso em: 10 mar. 2025.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Guia de informações sobre os fatores de riscos psicossociais relacionados ao trabalho. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: https://www.sstgames.com/material-gratuito . Acesso em: 16 abr. 2025.
MASCULO, José Roberto; VIDAL, Mário César. Ergonomia: trabalho adequado e eficiente. São Paulo: Manole, 2003.
VIDAL, Mário César. Guia para análise ergonômica do trabalho (AET) na empresa. São Paulo: Ed. Manole, 2002.
Comments