Viviane Alves*
A responsabilidade de escrever sobre um tema tão profundo, atual, sensível, importante é com diversos vieses é, acima de tudo, uma oportunidade ímpar de estimular e chamar à reflexão as empresas sobre este tema, bem como os RHs e cada indivíduo que tiver acesso a esse artigo.
Em pleno século XXI nos deparamos com as pessoas ainda lidando com a saúde mental com preconceito e tabu, e isso infelizmente atrapalha muito o processo de tratamento e cuidado da saúde nessa área que também é fundamental para a nossa saúde.
Os fatores que impactam a saúde mental são muitos: social, condições de trabalho, discriminação, violência de várias formas etc. Mas além do distanciamento, o isolamento social, o aumento de estresse, o medo, as perdas humanas e dos empregos gerou mudanças profundas no cotidiano das pessoas.
Houve também um aumento substancial do consumo de álcool e de drogas variadas, que tem gerado preocupação entres os especialistas, já que estas substâncias funcionam como um gatilho emocional. Segundo dados da Associação Brasileira de estudos de Álcool e Outras Drogas – (Abead) as vendas de bebidas cresceram 38% durante o período de isolamento social e 26% dos compradores estão na faixa de idade entre 30 e 39 anos.
Por isso desde o início da pandemia do coronavírus aumentou e muito a necessidade de uma abordagem assertiva e o investimento de tempo, ferramentas, profissionais e sistemas especializados para dar o melhor suporte possível para as pessoas, pois diante dos números alarmantes e crescentes de depressão, suicídio, agorafobia - um tipo de ansiedade provocada pelo medo estar em lugares ou situações que possam gerar algum tipo de constrangimento, sensação de estar encurralado ou risco ao indivíduo, fobia social, crise de pânico e ansiedade, síndrome de Burnout etc., vemos que ainda há uma grande espaço para explorarmos esse assunto e de chamar a atenção das empresas e das pessoas sobre a importância do cuidado e autocuidado com a saúde mental e emocional.
A saúde mental é um fator importante para lidarmos com as emoções positivas e negativas do nosso dia a dia, seja na área profissional, na vida pessoal ou social.
Investir em estratégias que possibilitem o equilíbrio das funções mentais é essencial para um convívio social mais saudável de modo geral, o que impacta de forma direta o ambiente organizacional.
A saúde emocional pode ser uma forte aliada ou um ponto de grande atenção das empresas por meio de seus RHs, pois afeta diretamente o desempenho, a produtividade e as relações interpessoais.
Manter e monitorar um ambiente emocionalmente saudável pode trazer muitos benefícios como: a positividade da força de trabalho, uma maior eficiência nos resultados da empresa, retenção de funcionários, redução da rotatividade, a diminuição da quantidade de faltas e, consequentemente, o aumento da produtividade.
Conforme o quadro abaixo, fonte da Psicologia Viva, de março de 2020 a março de 2021 a busca de novos pacientes por suporte emocional por meio de psicólogos aumentou em quase 800%. Por isso a relevância do tema em questão.
OS IMPACTOS DA PANDEMIA NA SAÚDE EMOCIONAL
Segundo a OMS, o conceito de saúde mental, vai além de não ter o diagnóstico de nenhuma doença. De acordo com a entidade, a saúde da mente só é possível quando há a vivência do bem-estar físico, mental e social.
Sendo assim, a organização considera alguns fatores determinantes para a manutenção da boa saúde mental: ausência de transtornos mentais, tratamento da saúde mental como parte integrante da saúde geral; condições favoráveis dos fatores socioeconômicos, biológicos e ambientais e intervenção para promoção, proteção e restauração da saúde mental, se necessário.
O isolamento afetou a saúde mental/emocional na medida em que elevou o estresse, ao nos preocupar-nos com condições, como: medo de contrair a doença; medo de se contaminar ou transmitir a doença a outras pessoas, perdas financeiras ou até mesmo do trabalho, incertezas em relação ao futuro, perda de amigos ou entes queridos que pode levar a sentimentos de raiva e tristeza profunda, culpa por perda de produtividade no trabalho etc.
Tudo isso impactou de forma direta as organizações e seus RHs, que precisaram se mobilizar de forma ágil, para dar conta de uma nova, frequente e enorme carga de novas e sensíveis demandas. Um processo extremamente impactante e avassalador para todos, inclusive para o RH, pois quem cuida, também precisa de cuidado.
As transformações impostas em nossos estilos de vida em decorrência da pandemia, ocorreram de maneira abrupta em um primeiro momento, como foi o caso do isolamento social radical (Lockdown) e a seguir o confinamento compulsório que exigiu uma mudança de rotina forçada e repentina e nesta fase, são comuns as manifestações de desamparo, tédio e raiva pela perda da liberdade.
Gerando assim o medo, a ansiedade, a irritabilidade e o desconforto em relação à nova realidade e a incerteza sobre o futuro, principalmente nas pessoas que foram internadas e passaram por uma experiência traumática nos casos de intubação e tratamento intensivo e que ainda se recuperam de sequelas deixadas pela doença.
Embora ainda seja tudo muito recente, existem estudos que indicam que metade dos entrevistados classificou os impactos psicológicos como moderado a grave, apontando a ansiedade entre uma das principais manifestações.
E ainda levaremos anos para saber o quanto as nações no mundo foram impactadas, pois o homem achava que tinha o controle de tudo, mas vivemos uma “terceira guerra mundial” em proporções e impactos inimagináveis, que entrou para a história como um capítulo triste e surpreendente da humanidade, ainda cheio de perguntas sem respostas.
O VALOR DO CUIDADO COM A SAÚDE EMOCIONAL
Assim, é preciso investir em ferramentas e construir de forma genuína uma cultura real de valorização do consenso e do diálogo dentro das empresas.
Desenvolver e promover o autoconhecimento também é fundamental para o desenvolvimento humano, o que acaba influenciando em todas as áreas da vida: seja profissional, pessoal ou social, pois gera a energia que move o individuo para frente nos estágios de mudança e abre o caminho para a auto eficácia e autoestima.
Uma saúde emocional em dia, possibilita que o funcionário consiga aplicar todas as suas habilidades e competências de forma produtiva, além de ter a capacidade emocional necessária para suportar todas as adversidades e situações de estresse que fazem parte do exercício de suas profissões e de suas vidas cotidianas.
E neste tópico não poderia deixar de citar a empatia, que de certa forma tem sido banalizada e distorcida na sua essência prática, pois ela é primordial no que tange dar o suporte de acordo com a necessidade real à pessoa que precisa.
Aplicar as técnicas da psicologia positiva como parte da cultura da empresa, investindo na consciência e capacitação da liderança e estimulando a sua aplicação efetiva nas rotinas de trabalho, gera resultado.
Também neste contexto temos ainda o suporte das técnicas de CNV-Comunicação não violenta, que também nos ajudam nessa longa e constante caminhada na construção de um ambiente saudável e responsável para todos que fazem parte dele.
Por isso os cuidados com a saúde mental são fundamentais para a qualidade de vida e para a prevenção de doenças. É fundamental para uma existência como individuo saudável, ativo e potente.
Esse cuidado pode ser feito através: da promoção de soluções de cuidados virtuais; campanhas de comunicação para mudar a visão sobre problemas emocionais e informar sobre os canais de apoio; medir, observar e monitorar o estresse da força de trabalho e suas principais causas; oferecer suporte emocional, estimular a prática de atividade física, sono de qualidade, meditação, “mindfulness”, alimentação e estilo de vida saudável. Criar e manter um ambiente com humor, o riso estimula a produção de endorfina e atua na imunidade.
Em resumo é difícil e quase impossível mensurarmos o valor desse cuidado sempre tão fundamental, mas neste momento histórico tão primordial, pois no mais amplo sentido do tema, estamos falando de vida – que tem um preço incalculável.
O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NA SAÚDE EMOCIONAL
Nas últimas décadas após a globalização e o avanço da tecnologia, vimos um avanço importante em vários aspectos, porém também surgiram novas preocupações e problemas oriundos da velocidade, volume e pressão psicológica e emocional que isto nos trouxe.
Durante a pandemia uma enxurrada de notícias e Fake News afetaram a condição de saúde mental de muitas pessoas, isso devido a agilidade dos mecanismos de transmissão e a facilidade de disseminação de informações equivocadas de maneira amplificada, o que gerou ainda mais medo, angústia e sofrimento nas pessoas.
Em paralelo à situação de pandemia que estamos vivenciando, enfrentamos também uma situação que os especialistas em comunicação e em saúde chamam de infodemia - uma epidemia de informação, que em alguns casos são inverídicas, mas que causam um grande efeito e impacto na saúde mental das pessoas que estão sendo atropeladas por informações de todos os lados e não conseguem checar a veracidade de tudo, por isso é necessário estar atento e seguir fontes seguras e com boa reputação.
Nos pontos acima é recomendado: limitar o tempo dedicado a informações sobre doenças e seus desdobramentos, não compartilhar informações não confirmadas, seguras e de fontes oficiais.
É importante também atentar ao tempo destinado a redes sociais e selecionar as páginas a serem seguidas. Buscar informações seguras, profissionais com boa reputação e informações que agreguem e somem de forma positiva e nunca o contrário. De vez em quando fazer um jejum de rede social, também gera uma limpeza mental saudável.
Basta estar conectado e logo você está sendo monitorado no mundo por diversas fontes, empresas e plataformas diferentes, que utilizam a inteligência artificial para influenciar e assim veem obtendo um resultado surpreendente fruto do extremo capitalismo e consumismo que se instalaram e que são extremamente estimulados o tempo todo, porém isso tem um impacto direto e real nas funções cognitivas, mentais e emocionais do ser humano, se for além do limite, dependendo do estado mental/emocional da pessoa etc.
Existe também um apelo e necessidade de “fazer parte” e de uma busca incessante de seguir ou se enquadrar em determinados padrões impostos pela sociedade e que afetam a essência natural humana, geram competição e dor sem fim. Este processo tem adoecido as pessoas de forma profunda e em alguns casos até fatal.
O importante e real não é a quantidade de relações sociais, mas a maneira como as percebemos e o apoio real que nos dedicam. A quantidade de curtidas e “amigos” no Facebook ou Instagram não é reconfortante se quase nenhum deles ajudará você em uma necessidade real, uma hospitalização etc. Os amigos de verdade, reais e não virtuais, estes sim fazem toda a diferença.
Recentemente vieram à tona notícias de pessoas que tem assumido publicamente que por recomendação médica deixaram de seguir determinadas ou todas as redes sociais, como parte de tratamento terapêutico e psicológico.
Em matéria do Jornal O Globo de 05.10.21 – Ex-funcionária do Facebook acusa a rede social de prejudicar crianças e enfraquecer a democracia.
“Um dia depois de ficar fora do ar, o Facebook voltou a virar tema de debate. Em depoimento ao Senado Americano, a ex-funcionária Frances Haugen fez graves acusações e disse que a empresa é “perigosa” e que coloca os lucros acima de tudo, inclusive da segurança.
E em matéria da BBC News Brasil de 10.10.21 – Porque algoritmos das redes sociais estão cada vez mais perigosos.
Na visão do pioneiro da IA- Inteligência Artificial – Stuart Russel, professor da Universidade da Califórnia em Berkeley:
“Tem advertido que o modelo predominantemente de IA é, em sua opinião, uma ameaça à sobrevivência dos seres humanos. A preocupação de Russel é com a forma como essa inteligência tem sido programada por seus desenvolvedores humanos: elas são incumbidas de otimizar o máximo possível suas tarefas, basicamente a qualquer custo. E, assim, tornam-se “cegas” e indiferentes aos problemas (ou, em última instância, à destruição) que podem causar aos humanos.”
O objetivo de compartilhar as informações acima que são públicas, são apenas de um modesto chamamento à reflexão, avaliação e possíveis ações que cada leitor julgar necessária, no sentido de se proteger e cuidar da própria saúde mental e de outras pessoas.
CONCLUSÃO
Em todos os contextos no que tange as empresas é muito importante o envolvimento da alta gestão, da liderança, do RH e do engajamento efetivo dos funcionários nas atividades e soluções propostas e oferecidas, do contrário não funcionará ou trará resultados positivos para a organização. Deve ser um trabalho feito de forma conjunta, em equipe e com o comprometimento genuíno de todos os envolvidos, pois estamos falando um processo profundo e complexo.
Para concluir essa modesta tentativa de chamamento a reflexão sobre a saúde mental, cito um trecho do livro Emoções e Saúde - Gilberto Ururahy & Éric Albert, o qual julguei pertinente e atual:
“O estresse crônico vivido pelo homem moderno é vetor para o estilo de vida inadequado e pouco saudável. A partir da liberação permanente na corrente sanguínea dos dois hormônios gerados pelo estresse, as pessoas abrem as portas de seu corpo para as mais diversas doenças, dependendo das individualidades. Segundo pesquisas realizadas na Universidade de Harvard nos Estados Unidos, 80% de todas as consultas médicas realizadas em todo o mundo têm relação com o estresse cotidiano.”
O cuidado com a saúde de forma integral – física, mental e espiritual é de suma importância e já existem diversos estudos que comprovam isso, sobretudo manter o equilíbrio entre todas as áreas da vida, ter qualidade de vida e nas relações interpessoais, pois TUDO em excesso é prejudicial, seja o que for...
Buscar o apoio quando se precisa, é um sinal de amor-próprio e inteligência e não de fragilidade.
O estilo de vida, escolhas, o foco e a disciplina influenciam diretamente na longevidade com qualidade. E sempre há tempo de construir uma nova rotina.
REFLITAM!
INFORMAÇÃO DE UTILIDADE PÚBLICA
CVV- Centro de Valorização da Vida – Disque 188
Uma instituição séria, com mais de 50 anos de existência, apolítica, a-religiosa, que através de seu voluntariado ao redor do mundo, se dedica a dar apoio emocional e prevenção ao suicídio, ouvindo de forma gratuita e sigilosa, pessoas que necessitam desse apoio 24 horas por dia, nos 7 dias da semana.
BIBLIOGRAFIA – REFERÊNCIAS
Site da www.psicologia.viva – Pesquisa sobre o aumento de busca por assistência psicológica na pandemia.
Site da OMS – Organização Mundial da Saúde - Conceito de saúde mental.
Livro Emoções e Saúde- Um novo olhar sobre a prevenção - Gilberto Ururahy & Éric Albert – Rio de Janeiro, Bicicleta Amarela, 2015.
MED-Rio Check-up – Material informativo sobre Saúde Mental em tempos de pandemia.
BBC Brasil – Matéria de 10.10.21- Porque algoritmos das redes sociais estão cada vez mais perigosos.
Jornal O Globo – Matéria de 05.10.21 - Ex-funcionária do Facebook acusa a rede social de prejudicar crianças e enfraquecer a democracia.
Artigo escrito por Viviane Alves, Administradora de empresas, membro do grupo de trabalho RH Legal | ABRH-RJ. Profissional com vinte e nove anos de experiência, e há dezessete anos atuando na gestão de Recursos Humanos generalista na Reestruturação e Transformação Cultural, Gestão da Mudança, Gestão de Desempenho, Treinamento e Desenvolvimento, Recrutamento e Seleção, Comunicação Corporativa, Endomarketing, Administração de Pessoal, Remuneração e outros temas. Atuou em empresas de diversos portes, seguimentos e nacionalidades e, atualmente, é Gerente de Recursos Humanos em uma indústria multinacional com foco no mercado de Petróleo e Gás – LESER Válvulas de Segurança LTDA.
Saúde mental precisa ser pauta das discussões e prática nas esferas privadas e pública!
É preciso executar espaços menos adoecedores, bem como, investir em meios para promoção de cuidado e tratamento para casos nos quais a situação de doença já está estabelecida.
Parabéns, Viviane Alves pela sensibilidade de escrever sobre um tema tão importante.
Excelente artigo, com informações e dados relevantes. Parabéns, Viviane.